Às vezes fico pensando no que diz a extrema direita, ecoada por uma turba, não sei se fanática ou carente por alguns segundos de brilho no mundo virtual, onde postam comentários quase sempre desconexos, sobre vivermos sob uma ditadura. Quem, como eu, viveu 21 anos debaixo de uma, sabe como tudo isso é falso. Mesmo sem ter sido afetado diretamente (isto é, preso ou torturado), sempre ouvi conselhos para falar baixo, aos quais, por medo ou prudência, sempre acolhia (exceto nas mesas de boteco. Afinal ninguém é de ferro).
Já leu ou ouviu atualmente nos jornais, eletrônicos ou impressos, sobre alguém ser morto por postar inocentemente uma foto onde posa fazendo determinado gesto? Com as devidas ressalvas, naquela época os riscos também estavam onde menos se esperava, até mesmo um simples erro de interpretação, por parte dos algozes, poderia ser fatal.
Se pego, já era. A ponta do iceberg indica 400 assassinatos e mais de 20 mil torturados. Só para lembrar, entre 1968/74 (período conhecido como Anos de Chumbo), surgiram e atuaram os esquadrões da morte, perseguindo e matando possíveis oponentes da ditadura militar e, de quebra, eliminando literalmente a pobreza e mantendo a limpeza étnica, ainda hoje uma realidade. Basta ver os números divulgados anualmente pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Na verdade, pelo menos as lideranças sabem muito bem que esta ditadura recitada insistentemente por eles não existe. Usam-na para, justamente, reimplantá-la e impor uma ideologia reacionária e fascista e, de quebra, atender aos interesses de quem os mantêm na esfera do poder, com todas os privilégios a que se acham no direito de usufruir. Enquanto votam contra taxação a bilionários e milionários, aproveitam para passar a boiada em temas totalmente dissonantes dos interesses da grande maioria.
Como aconteceu na semana passada, quando a Câmara dos Deputados foi palco de mais um show de horrores, ao votar o PL da Dosimetria (para reduzir a pena de um golpista que teve todos seus os direitos assegurados ao ser julgado pelo crime cometido) e a preservação do mandato de Carla Zambelli (presa na Itália por estar condenada no Brasil).
Como se não bastasse, ainda “concederam” tratamento “chicano” ao deputado psolista Glauber Braga, por ter ocupado a mesa de Hugo Motta, incluindo expulsão, e até agressão, de jornalistas do plenário pela polícia legislativa, antes de retirá-lo à força. Este tratamento não deveria ser “franciscano”, como ocorreu recentemente, quando deputados da extrema direita também ocuparam a mesa-diretora?
Resumo da ópera: se eles aprontam até quando estão sendo monitorados, mostrando desdém ao evidente descontentamento da maioria da sociedade contra o atual congresso; se deixar pra lá, a situação tende a se deteriorar. Em setembro, quando a Orla Carioca e a Avenida Paulista receberam, cada uma, mais de 40 mil pessoas contra a PEC da Bandidagem, também votada pela madrugada, a situação se reverteu no Senado. Espero que a de ontem tenha repetido o recado.
P.S: O recado foi novamente dado. Só não se sabe se acatado. Para evitar novas recaídas, melhor que continuem monitorados.
Jairo Pitolé Sant’Ana é jornalista

* A opinião do articulista não reflete necessariamente a opinião do PNB Online

























