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ESTUDOS CEMITERIAIS

Pesquisadores da UFMT e da UFG organizam dossiê com textos sobre a morte: “Em vida, morte, te sei”

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Maristela Carneiro tem uma relação com a morte que começa desde o início de sua vida. Quando criança era levada pelos familiares ao cemitério para visitas aos parentes que já se foram. A naturalidade rotineira com que aquilo se passava na infância acabou fazendo com que a pesquisadora olhasse de maneira menos catastrófica para a “indesejada das gentes”, como dizia o poeta Manuel Bandeira.

“Eu gosto de visitar cemitérios desde criança. Era hábito da minha família visitar nossos entes queridos falecidos com certa frequência, então eu sempre me senti muito à vontade no espaço cemiterial”, diz a pesquisadora.

Ao entrar na graduação, Maristela começou quase que automaticamente a pesquisar cemitérios e cultura funerária. Passo importante de sua trajetória acadêmica foi a organização e publicação do dossiê “Em vida, morte, te sei”: olhares interdisciplinares sobre a finitude contemporânea (séculos XX-XXI)” pela Revista Tempo, Espaço e Linguagem (TEL) na edição deste mês de dezembro, em parceria com o pesquisador Frederico Tadeu Gondim, da Universidade Federal de Goiás (UFG).

O título do dossiê rememora a outra poeta, a modernista Hilda Hilst (“Te sei. Em vida/Provei teu gosto./Perda, partidas/Memória, pó”), e parece exemplificar aquilo que Maristela e Frederico propõem com o dossiê: o gosto da morte é sentido ainda durante a vida.

“O meu interesse pessoal com relação a pensar a morte e refletir sobre a morte é um interesse de vida, não é um interesse meramente acadêmico”, diz Frederico. “É muito importante que a gente fale [sobre a morte] para que a gente se sinta menos solitário no mundo, solitário com relação ao fato de que todo mundo vai passar por isso em algum momento e não temos respostas como gostaríamos”, completa o pesquisador Frederico.

O trabalho também inclui um artigo livre e uma entrevista com Maria Elizia Borges, considerada uma precursora nos estudos cemiteriais e funerários no Brasil. A diversidade de autores abrange diferentes áreas como história, comunicação, estudos sociais, filosofia e direito, e provém de várias regiões do país. A iniciativa busca levar a discussão sobre a morte para um público mais amplo, além do meio acadêmico.

O texto também contém artigo assinado pelo doutor Pedro Pinto de Oliveira em parceria com o doutorando Marcelo Duarte, do Programa de Pós-Graduação em Estudos de Cultura Contemporânea (ECCO).

Maristela Carneiro destaca a amplitude de abordagens presentes no dossiê. “Nós recebemos e aprovamos 18 textos com análise cega, com pareceristas cegos fazendo a avaliação de cada um dos textos. Desses 18, dois textos são internacionais, o que representa algo relevante para uma revista como a TEL”, afirma Carneiro.

Ela ressalta que o dossiê revela uma grande diversidade de interesses e facetas pelas quais a morte pode ser abordada, incluindo a morte animal, cortejos fúnebres, algoritmos para pensar a experiência da morte, e a morte como espetáculo.

Frederico Tadeu Gondim, que também organizou o dossiê, enfatiza o papel da publicação em desmistificar o tema. “Eu acredito que esse dossiê, ele é mais um passo assim dentre outros, que nos ajudam a desmistificar todo o silêncio e toda a vergonha e o medo historicamente construídos em torno da morte”, declara Gondim. Ele acrescenta que o dossiê contribui para que as pessoas se sintam “menos solitárias com relação a esse processo pelo qual todo mundo vai passar”, declarou o pesquisador.

Interessada por cemitérios deste a infância, Maristela diz que trata o tema com naturalidade, sem enxergar no fim da existência o medo ou a preocupação que normalmente é comum a toda gente, como Manuel Bandeira relatava em seus versos (“Quando a indesejada das gentes chegar/[…] talvez eu tenha medo”). Ela afirma:

“É claro que ela me pesa quando entes queridos falecem, quando eu tenho perdas pessoais, mas quando eu a estudo, eu penso a finitude em uma perspectiva acadêmica. É mais fácil observar com um certo distanciamento e compreender porque as pessoas agem como agem, e analisar as respostas que dão à finitude em particular”, diz a pesquisadora.

Carneiro afirma que ao longo dos anos os brasileiros estão estabelecendo uma nova relação com a morte, que deixou de ser vista como tabu, como ocorria até os anos 80. No entanto, para a pesquisadora, o desaparecimento de atos cerimoniais durante aos eventos de morte tem um impacto direto na forma como as pessoas vivem e encaram o luto. Ela alega que mesmo com a expectativa de vida alta, o mundo cada vez mais movido pela celeridade do capitalismo faz com que as pessoas não tenham tempo para encarar a dor de suas perdas.

“O sofrimento em relação à morte é cada vez mais individual e isso impacta emocionalmente as pessoas, impacta a forma como elas vivem, faz com que elas sejam mais deprimidas, faz com que elas não vivenciem o luto de uma maneira mais social, como era antes, e por isso acabam sofrendo sozinhas”, diz a pesquisadora.

Nos últimos anos, conforme ela, a morte foi deixando de ser um tabu também por conta dos estudos sobre este fenômeno. Como exemplo, ela cita a criação da Associação Brasileira de Estudos Cemiteriais (Abec).

“Junto com essas iniciativas em rede, muitas pessoas e muitos pesquisadores acabam fazendo visitas quase que turísticas aos cemitérios, guias de visitação que contribuem para que as pessoas se sintam mais à vontade no espaço cemiterial”, diz.

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